Intermitência

Fim do dia. Início da noite. O cansaço era mortal. As ruas, infindáveis. O que dava a travessia ares de aventura. Já não tinha mais idade para tanto. E a aposentadoria? Qual o quê? Talvez a tivesse quando chegar ao Hades. Bonachão e ridículo! A caduquice insistia acompanhar. Às vezes respondia, vermelho. Qual o quê? E o passante ria-se do susto. Era apenas o princípio. Apenas. O vento batia contra o rosto. Fosse a favor… talvez adiantasse alguma coisa. O quê. Não sabia. Duvidava. O quê? Não sabia. Qual o quê? E outro passante ria-se. Por quanto tempo caminhava não sabia. Sabia d’alguma coisa? Não Sabia. Se soubesse questionava! Tinha tempo. A viagem era longa. Chegaria ao inferno. Se existisse. Mas a casa existe. Mas não chega nunca. Chega. Não chega. Chega. Outra esquina. Qual o quê? Topou um conhecido. Caduco. Velho conhecido. Não se cansava nunca. Sabido. “Ora se não é o poeta!”. Dizia. “Canta aquela”. Pedia. Qual? O quê? E ria. Quem? Não sabia. “Canta?”. O princípio? O fim? Na dúvida o meio:

– Tróia tanto tenta torpe pula para cá nada adianta pula para acolá adiante diante da
[morte entorpecidos cabeça cacolá granada bum bum bum grito ahhh adiante
[bum bum bum tímpano estourado explode bomba na batalha que que que
[nada se entende.

Suspense. Ri-se o passante. “Velho maluco”. Mas que ingrato matuto. É de ficar vermelho. E foi embora o ingrato, em boa hora, sem dizer obrigado.

Fim do dia. Início da noite. A travessia continua. Por quanto tempo? Não sabia. E essa era a única certeza: não saber. Os pés já não sentia. Cansado. Está chegando o Monte Olimpo. Miragem. Mentira. A casa é logo depois. Quão distante não sabia. Miragem. Qual o quê? Mentira. Ninguém por perto. Desistir. Desistir? Mas falta pouco. Quanto tempo? Sabia não. O que fazer? Caminhar. Em linha reta. Depois curva. Direita. Em frente. Esquerda. Para trás. Para trás? invertido Fica. esquina Outra. seguinte Viela. o quê Qual? na passante Susto. “Ora se não é o poeta!” dizia Ela. “Para onde vai?”. trás Para. “Caduco”. Zombeteira, nos nervos dá. “Procura por algo?”. Perguntou. O porquê foi a resposta. “Canta aquela!”. pediu Ela. O quê? Qual? sempre o meio Na dúvida:

– “E sempre no meu sempre a mesma ausência”.

Silêncio. A passante. Eu. Olhos nos olhos. canto Não houve mais. voz Não houve mais. poeta Não houve. zombaria Deixou de ser… silêncio… o quê Ficou? Amores. Saudades. Prazeres. Guerras. Etc. Etc. Etc. Dor. Qual o quê? na passante Susto. “E tudo resumiu-se em dor?”. dizia Ela. “Caduco! Ridículo!” saiu Ela entre o sim e o não. Procurando. procurar O quê? Caminhos: esquerda; curva; frente em… Porquê? Em frente? Obstáculo vencido. Como? Caminhar é preciso. Viver… bem, isso outro poeta já disse.

Fim do dia. Início da noite. Lar longínquo. Longos passos mortos. Caminhos. Meios. Há sempre meios nos meios. Era apenas o princípio. Apenas. Qual o quê? E ria o passante. É de ficar vermelho. “Ora se não é o poeta!”. Já não tinha mais susto. “Canta aquela, caduco!”. Cansaço:

“O mundo é dividido pelo meio
A bunda é dividida pelo meio
E o que é que tem no meio?”

Há sempre meios nos meios…

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